Direitos laborais em Portugal: o que precisa de saber sobre férias, baixas e licenças

Direitos laborais em Portugal: o que precisa de saber sobre férias, baixas e licenças

Há momentos na vida profissional em que as regras contam tanto quanto o trabalho em si. Saber quando pode parar, por que motivo e com que garantias faz parte da literacia laboral e financeira que todos devíamos dominar.
Em Portugal, o Código do Trabalho estabelece um conjunto de direitos que protegem o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Neste artigo explicamos, de forma clara e prática, o essencial sobre férias, baixas e licenças, três pilares da vida laboral que, quando bem compreendidos, ajudam a evitar erros, perdas salariais ou conflitos com o empregador.

O enquadramento geral: o contrato e o Código do Trabalho

O ponto de partida de qualquer relação laboral é o contrato de trabalho. É nele que se define o tipo de vínculo (sem termo, a termo certo, a termo incerto, parcial, entre outros) e os direitos que o acompanham.
Independentemente da forma, o contrato deve garantir:

  • remuneração de acordo com o salário mínimo nacional, que em 2025 é de 870 euros mensais;
  • acesso à Segurança Social, que cobre doença, parentalidade, desemprego e velhice;
  • direito a férias pagas e subsídios legais;
  • proteção da saúde e segurança no trabalho, fiscalizada pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).

Estes direitos são irrenunciáveis: mesmo que um trabalhador aceite menos, a lei prevalece.

As férias: descanso com direitos

As férias não são um privilégio, são um direito fundamental, inscrito no artigo 237.º do Código do Trabalho. Têm uma função clara: garantir que cada pessoa possa descansar e recuperar física e mentalmente.

Duração e cálculo

O trabalhador tem direito, por norma, a 22 dias úteis de férias por ano civil, que correspondem a quatro semanas.
Se começar a trabalhar a meio do ano, adquire 2 dias de férias por cada mês completo de trabalho, até um máximo de 20 dias.

Exemplo:
Se entrou numa empresa a 1 de março, no final do ano terá direito a 20 dias de férias (10 meses x 2 dias).

As férias vencem-se a 1 de janeiro de cada ano e devem ser gozadas até 30 de abril do ano seguinte. O pagamento é composto por:

  • retribuição normal;
  • subsídio de férias, equivalente a um mês de salário.

Marcação

A marcação deve ser acordada entre trabalhador e empregador. Na falta de acordo, o empregador define o período, respeitando as preferências do trabalhador e garantindo, sempre que possível, o gozo entre 1 de maio e 31 de outubro.

As empresas com encerramento coletivo (como fábricas ou escolas) podem fixar férias nesse período, desde que informem com antecedência mínima de 2 meses.

Férias não gozadas

Não pode haver substituição de férias por dinheiro, exceto se o contrato terminar antes de as gozar. Nesse caso, o trabalhador recebe o valor proporcional às férias vencidas e não gozadas.
Importante: o direito a férias é irrenunciável, não pode abdicar dele, mesmo que queira.

As baixas médicas: proteção na doença

A doença pode interromper o trabalho, mas não deve interromper a segurança financeira.
Em Portugal, quando um trabalhador fica doente e não pode exercer funções, tem direito a subsídio de doença pago pela Segurança Social, desde que cumpra certas condições.

Quem tem direito

Tem direito ao subsídio de doença quem:

  • está inscrito e com descontos regulares para a Segurança Social;
  • tem pelo menos 6 meses de contribuições (seguidos ou não);
  • apresenta certificado de incapacidade temporária (CIT), emitido pelo médico.

Duração e valor

O valor diário do subsídio depende do rendimento médio e do tempo de baixa. A percentagem da remuneração de referência é:

  • 55% entre o 4.º e o 30.º dia;
  • 60% do 31.º ao 90.º dia;
  • 70% do 91.º ao 365.º dia;
  • 75% a partir do 366.º dia.

Nos primeiros três dias, não há pagamento, chamam-se “dias de espera”.

O limite máximo de duração é de 1.095 dias (3 anos), mas se houver incapacidade prolongada, pode transitar para pensão de invalidez.

Doença profissional e acidentes de trabalho

Se a doença resultar do trabalho ou de acidente laboral, a compensação é garantida por seguro obrigatório e o trabalhador tem direito a:

  • tratamento médico gratuito;
  • indemnização proporcional à incapacidade;
  • eventual reintegração se recuperar.

Estes casos são fiscalizados pela ACT e pela Segurança Social, e a responsabilidade recai, em parte, sobre o empregador.

Licenças: os tempos da vida pessoal e familiar

Nem todas as pausas são doença ou férias. Algumas são etapas naturais da vida: ter um filho, cuidar de familiares, ou fazer luto.
O Código do Trabalho define várias licenças, e a Segurança Social garante a compensação financeira.

Licença parental

É talvez a mais conhecida. Inclui:

  • licença parental inicial (120 ou 150 dias consecutivos, podendo ser partilhados entre mãe e pai);
  • licença parental exclusiva da mãe (6 semanas obrigatórias após o parto);
  • licença parental exclusiva do pai (28 dias, dos quais 7 imediatamente após o nascimento).

O valor pago varia:

  • 100% do salário se forem 120 dias;
  • 80% se forem 150 dias;
  • 100% se forem partilhados (até 30 dias adicionais).

Durante este período, há proteção total contra despedimento.

Licença por adoção

Os mesmos direitos aplicam-se à adoção de crianças com menos de 15 anos.

Licença para assistência a filhos

Pode ser usada até aos 12 anos do filho ou em caso de doença crónica.

  • até 30 dias por ano para cuidar de filhos até 12 anos;
  • até 15 dias se tiverem mais de 12.

Em ambos os casos, há compensação parcial paga pela Segurança Social.

Licença para assistência a familiar

Abrange pais, cônjuges ou pessoas em comunhão de habitação. Garante até 15 dias por ano, mediante apresentação de comprovativo médico.

Licença por luto

Desde 2022, o trabalhador tem direito a 20 dias consecutivos de licença por falecimento de filho e 5 dias por falecimento de cônjuge, pai, mãe ou equivalente.

Equilíbrio entre direitos e deveres

Os direitos laborais não são apenas proteções: são parte de um sistema de confiança mútua.
O trabalhador tem o dever de:

  • cumprir o horário de trabalho (máximo de 8 horas por dia e 40 por semana);
  • respeitar normas de segurança e usar equipamentos fornecidos;
  • informar a empresa com antecedência em caso de ausência previsível (ex: consultas, apoio familiar).

O empregador, por sua vez, deve:

  • garantir locais de trabalho seguros e saudáveis;
  • não discriminar com base em género, idade, orientação ou condição;
  • respeitar horários, férias e períodos de descanso (mínimo 11 horas entre turnos).

Estes princípios estão inscritos no Código do Trabalho e são fiscalizados pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).

Direitos laborais e literacia financeira: duas faces da mesma moeda

Saber o que se ganha e o que se mantém quando se fica doente ou de licença é uma forma de literacia financeira.
Por exemplo:

  • O subsídio de férias e de Natal é rendimento sujeito a IRS e contribuições sociais.
  • O subsídio de doença não é pago a 100% e deve ser tido em conta no planeamento do orçamento familiar.
  • As licenças parentais são períodos com remuneração variável, o que pode exigir reserva financeira prévia.

Um trabalhador informado protege não só os seus direitos, mas também a sua estabilidade financeira.

Quando os direitos não são respeitados

Se sentir que o seu empregador não cumpre as obrigações, recusa de férias, falta de pagamento de subsídios, despedimento injustificado ou ausência de condições de segurança, pode agir.

As vias principais são:

  • ACT (Autoridade para as Condições do Trabalho) – para denúncias ou pedidos de fiscalização;
  • Segurança Social – para esclarecimento sobre subsídios e licenças;
  • Comissões de Trabalhadores ou Sindicatos – para acompanhamento jurídico;
  • Tribunal do Trabalho – em última instância.

A denúncia é confidencial e pode ser feita online através do portal da ACT.

Conclusão: trabalhar com direitos é trabalhar com dignidade

Os direitos laborais não são burocracia, são o alicerce de uma vida equilibrada.
Garantem que, mesmo quando o corpo precisa de parar, ou a vida exige tempo fora do trabalho, o rendimento e a dignidade permanecem protegidos.

Num país onde a literacia financeira e jurídica ainda é desigual, conhecer o que a lei assegura é um passo essencial para a autonomia e para o respeito mútuo nas relações laborais.
Porque um emprego digno não é apenas aquele que paga: é o que respeita.

Glossário essencial

TermoSignificadoACTAutoridade para as Condições do Trabalho. Entidade que fiscaliza o cumprimento das leis laborais.Código do TrabalhoLei principal que regula as relações laborais em Portugal.Contrato de trabalhoAcordo entre trabalhador e empregador que define funções, remuneração e direitos.FériasPeríodo anual de descanso remunerado (22 dias úteis).Licença parentalPeríodo de afastamento do trabalho por nascimento ou adoção de filho.Subsídio de doençaApoio financeiro da Segurança Social durante baixa médica.Segurança SocialSistema público que garante prestações em situações de doença, desemprego, parentalidade e reforma.TAEGTaxa Anual Efetiva Global, custo total de um crédito (usado em literacia financeira).Salário mínimo nacionalValor mínimo mensal que pode ser pago legalmente a um trabalhador.

Fontes consultadas

  1. Código do Trabalho (Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e atualizações)
  2. Segurança Social – Portal oficial: www.seg-social.pt
  3. Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT): www.act.gov.pt
  4. Direitos Laborais em Portugal – Documento de apoio
  5. Decretos-Lei n.º 107/2023 e n.º 112/2024 – Salário mínimo nacional
  6. Diário da República Eletrónico – Legislação consolidada sobre trabalho e parentalidade

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