Guia passo a passo para comprar casa em Portugal com crédito habitação.
Introdução
Comprar casa é uma decisão com impacto financeiro e emocional. O processo tem várias etapas, custos e prazos. O nosso objetivo é simples: dar-lhe um roteiro claro, para avançar com confiança e evite surpresas. Vamos do orçamento à escritura, com exemplos, listas e alertas práticos.
Preparação financeira e definição do orçamento
O ponto de partida
Antes de ver anúncios, definimos quanto podemos pagar todos os meses sem apertos. Olhamos para:
- Rendimento líquido do agregado.
- Prestações de créditos já existentes.
- Despesas fixas mensais.
Como regra de conforto, mantemos a prestação total de créditos entre 30% e 35% do rendimento líquido. Este intervalo dá folga para variações da taxa e para imprevistos.
Quanto o banco pode financiar
- Primeira habitação: referência até 90% do menor valor entre preço e avaliação.
- Segunda habitação ou investimento: referência até 80%, podendo alguns bancos ficar nos 60% a 70%.
- Isto significa que precisamos de entrada e de verba para impostos e formalização.
Quanto capital próprio precisamos
Planeamos a entrada e somamos impostos, registos e escritura. Como regra de bolso, consideramos 10% a 20% do preço para a entrada mais cerca de 10% para impostos e formalização.
Exemplo rápido: imóvel de 200 000 euros. Entrada de 10% igual a 20 000 euros. Custos iniciais na ordem dos 20 000 euros. Total de fundos próprios necessários cerca de 40 000 euros.
Prazos e impacto no custo total
Prazos maiores reduzem a prestação mensal, mas aumentam os juros totais. Definimos um prazo que nos deixe confortável hoje e no futuro. Sempre que possível, planeamos amortizações parciais para reduzir o custo total do crédito.
Fundo de emergência
Após pagar a entrada, mantemos um fundo equivalente a três a seis meses de despesas fixas. Este colchão evita recorrer a crédito caro quando surge um imprevisto.
Dica para jovens compradores
Se tem até 35 anos e vai comprar primeira habitação para residência própria, informe-se sobre eventuais apoios e garantias públicas que reduzam a necessidade de entrada. Confirme sempre elegibilidade, tetos e condições no momento da decisão.
Pesquisa e seleção do imóvel.
Definir critérios
Criamos uma matriz simples com três níveis.
- Obrigatório: tipologia mínima, localização macro, elevador quando necessário.
- Importante: área útil, estacionamento, classe energética.
- Bom ter: varanda, arrecadação, vista.
Esta hierarquia permite decidir com cabeça fria quando houver compromissos.
Onde procurar
- Portais imobiliários para mapear preços por zona e comparar m2.
- Agências locais para aceder a imóveis que ainda não chegaram aos portais.
- Rede de contactos, vizinhança e comércio local para captar oportunidades.
Como visitar com método
Levamos uma lista de lembretes e avaliamos:
- Exposição solar e luminosidade.
- Ruído e qualidade das caixilharias.
- Sinais de infiltrações e humidade.
- Pressão de água e idade das canalizações.
- Quadro elétrico e número de circuitos.
- Estado das zonas comuns, telhado e fachadas.
Registamos fotografias, medidas e uma classificação de 1 a 5 para cada critério. Visitamos em diferentes horários para perceber trânsito, estacionamento e ruído.
Como comparar opções
Usamos uma tabela com preço, m2, preço por m2, classe energética, condomínio, estacionamento, proximidade a transportes e escolas, necessidade de obras. A soma ponderada ajuda a decidir com base em dados e não em impressões momentâneas.
Alertas em usados e novos.
Em usados, confirmamos a idade do edifício, intervenções estruturais, atas e fundo de reserva do condomínio. Em novos ou em planta, verificamos promotor, prazos, garantias e seguros. Em ambos os casos, validamos plantas e áreas.
Localização e potencial de valorização
O que conta hoje
- Acessos e transportes.
- Comércio e serviços.
- Escolas, saúde e espaços verdes.
- Segurança diurna e noturna.
- Estacionamento e trânsito nas horas de ponta.
Vetores de valorização no médio prazo
- Novas estações de metro ou comboio, eixos rodoviários, polos universitários, hospitais e centros empresariais.
- Requalificação urbana e melhorias do espaço público.
- Estas dinâmicas tendem a puxar preços e procura, mas a valorização nunca é garantida. Investidores devem privilegiar zonas com liquidez e procura estrutural.
Como ler sinais de tendência
Observamos obras em curso, tempo médio de venda, número de anúncios ativos e conversamos com comerciantes. Revisitamos o bairro ao início da manhã, ao final da tarde e ao fim de semana. Esta rotina mostra o que as fotos do anúncio não revelam.
Simulação do crédito e pré-aprovação
O que comparar
- TAEG para comparar custo total.
- Spread e indexante.
- Comissões de dossier, avaliação e processamento.
- Produtos associados exigidos como conta ordenado, cartões e seguros.
- Prazo, condições de amortização e eventuais penalizações.
Vantagens da pré-aprovação
• Prova de capacidade financeira para negociar melhor.
• Prazos realistas para CPCV e escritura.
• Redução de surpresas na fase final.
Documentação que convém preparar cedo
Identificação, recibos de vencimento, declaração anual, extratos bancários, contrato de trabalho, mapa de responsabilidades de crédito. Dossier completo acelera a análise.
Taxa fixa, variável e mista
• Variável acompanha indexante e altera a prestação ao longo do tempo.
• Fixa dá previsibilidade, geralmente com custo inicial maior.
• Mista combina um período fixo e, depois, variável.
Escolhemos conforme tolerância ao risco, horizonte temporal e folga orçamental.
Negociação e CPCV
Estratégia de negociação
Entramos com comparáveis de mercado e com pré-aprovação. Evitamos ofertas impulsivas. Propomos prazos claros e, quando necessário, solicitamos inspeção técnica antes do CPCV. Se a avaliação for uma incógnita, tentamos cláusula de ajuste caso fique abaixo de um limiar.
O que um CPCV deve conter
- Identificação das partes e do imóvel.
- Preço e forma de pagamento.
- Valor do sinal e prazos.
- Prazo máximo para escritura.
- Condições suspensivas, como aprovação de crédito.
- Repartição de custos e declarações do vendedor.
- Guardamos comprovativos e assinamos em duas via originais.
Sinal e consequências
Se o comprador desiste sem motivo contratual, perde o sinal. Se o vendedor falha, devolve o dobro. Para evitar conflitos, reduzimos ambiguidades e registamos tudo.
Avaliação bancária e aprovação final
Como se faz a avaliação
Perito independente visita o imóvel, analisa local, tipologia, estado, áreas e comparáveis. O banco aplica a percentagem de financiamento sobre o menor valor entre preço e avaliação. Comprar muito acima do mercado pode obrigar a reforçar capitais próprios.
Custos e calendário
A avaliação é paga pelo cliente. O banco só marca escritura quando a documentação está completa e seguros ativos. Planeamos o calendário com margem. Entre oferta vinculativa, período de reflexão e marcação, um mês passa depressa.
A FINE e o que confirmar
Montante, prazo, tipo de taxa, indexante, spread, TAEG, prestação estimada, comissões e seguros. Confirmamos se tudo bate certo com o acordado. Qualquer divergência é esclarecida por escrito antes da aceitação.
Verificações legais e documentação do imóvel
Documentos essenciais
• Certidão de registo predial para titularidade e ónus.
• Caderneta predial com artigo e VPT.
• Certificado energético válido.
• Licença de utilização quando exigível.
• Ficha técnica para imóveis recentes ou reabilitados.
• Plantas e áreas.
• Declaração do condomínio sobre quotas e obras.
Preferências e ocupação
Verificamos se existem direitos de preferência de inquilinos ou do município. Confirmamos que a casa será entregue livre de pessoas e bens. Pedimos renúncias formais quando aplicável.
O papel do advogado ou solicitador
Um profissional experiente deteta discrepâncias, identifica construções não licenciadas, orienta soluções e garante que a minuta da escritura reflete o combinado. Este custo é um seguro contra problemas caros.
Escritura de compra e venda
Onde e com quem
Conservatória pelo serviço Casa Pronta ou cartório notarial. Estão presentes comprador, vendedor, representante do banco e, muitas vezes, advogado ou solicitador. Lemos a escritura, confirmamos valores e assinamos a compra e o mútuo com hipoteca.
Impostos antes da escritura
Pagamos IMT conforme a tabela aplicável e imposto do selo sobre a compra. Sobre o empréstimo, há imposto do selo específico. Os comprovativos são apresentados no ato. O banco pode tratar do selo do mútuo e debitar depois.
Pagamento e registos
O pagamento ao vendedor faz-se por cheque bancário ou transferência imediata. Se houver hipoteca antiga, parte do valor liquida o empréstimo anterior e emite o distrate. Após a assinatura, são submetidos os registos de aquisição e de hipoteca. Guardamos minutas e comprovativos.
Pós-escritura imediato
Mudamos a titularidade de água, luz e gás. Atualizamos morada fiscal. Revemos coberturas dos seguros. Planeamos as primeiras manutenções. Confirmamos eventuais isenções e prazos junto da autarquia quando aplicável.
Custos detalhados a prever
Custos de aquisição
• IMT conforme valor e finalidade.
• Imposto do selo na compra.
• Imposto do selo no crédito.
• Comissões bancárias.
• Avaliação.
• Escritura e registos.
Para referência rápida, preparar cerca de 10% do preço para cobrir impostos e formalização evita surpresas, sabendo que percentagens exatas dependem do caso.
Seguros obrigatórios e recomendados
O multirriscos é obrigatório em edifícios em propriedade horizontal. O banco exigirá, na prática, um seguro de vida associado ao crédito. Comparamos apólices internas do banco com alternativas externas equivalentes. Diferenças pequenas no prémio acumulam muito ao longo do prazo.
Custos recorrentes
IMI anual, condomínio, fundo de reserva, manutenção preventiva e corretiva. Proprietários prudentes orçamentam cerca de 1% do valor do imóvel por ano para manutenção, sobretudo em casas com mais de 20 anos. Não é regra rígida, mas ajuda a evitar adiamentos que saem caros.
Exemplo completo
Imóvel de 220 000 euros, primeira habitação. Entrada de 10% igual a 22 000 euros. Custos iniciais próximos de 22 000 euros. Empréstimo de 198 000 euros. Se o rendimento líquido do agregado for 2 800 euros, uma prestação alvo de 980 euros mantém a taxa de esforço perto de 35%. É apenas um exemplo ilustrativo, mas mostra a necessidade de alinhar entrada, custos e prestação com o rendimento real.
Papéis e responsabilidades
Mediador imobiliário
Filtra imóveis, agenda visitas, recolhe documentação e apoia a negociação. Trabalha para fechar o negócio, por isso mantemos espírito crítico e confirmamos por nós os documentos.
Banco
Analisa risco, aprova o empréstimo, contrata avaliação e liberta fundos na escritura. Explica condições e exige cumprimento de requisitos como seguros e entrega de documentos.
Intermediário de crédito
Compara ofertas de vários bancos, clarifica TAEG, spread e comissões, explica cenários de taxa fixa e variável, trata do fluxo documental e acompanha até à escritura. O objetivo é transparência e adequação da solução ao perfil do cliente.
Advogado ou solicitador
Responsável pela conformidade legal, revisão do CPCV, preparação da escritura e validação de registos. Reduz riscos e previne litígios.
Notário ou conservador
Confere identidades, verifica documentos, formaliza contratos e submete registos. Garante neutralidade e legalidade.
Estratégias por objetivo
Habitação própria permanente
Damos prioridade a localização útil, conforto térmico e acústico, proximidade de escolas e transportes, e custos de operação sustentáveis. Financiamento mais elevado ajuda a reduzir a entrada, mas mantemos margem para custos e imprevistos. Se prevemos crescimento do agregado, consideramos uma tipologia com um quarto extra.
Investimento para arrendamento
Decisão financeira antes de emocional. Estimamos renda realista, calculamos yield bruto e líquido, consideramos períodos de vacância e custos. Procuramos zonas com procura constante, como proximidade de universidades ou hospitais. Negociamos com base em retorno e liquidez futura.
Casa de férias
Escolhemos um local que vamos realmente usar. Medimos a distância e a logística de manutenção. Consideramos custos fixos sem rendimento associado. Se ponderamos arrendamento sazonal, confirmamos regras locais e aceitação do condomínio. O financiamento é mais exigente, por isso planeamos com folga.
Calendário tipo do processo
Linha do tempo
• Semanas 1 a 2: preparação financeira e recolha de documentação.
• Semanas 3 a 6: pesquisa e visitas.
• Semana 7: proposta e negociação.
• Semana 8: CPCV.
• Semanas 9 a 11: avaliação, análise final e FINE.
• Semana 12: escritura.
É um calendário indicativo. Sem pré-aprovação e sem dossier completo, estica facilmente.
O que mais atrasa
Falta de documentos, avaliações com ressalvas, divergências entre planta e realidade, indefinições sobre obras de condomínio. Antecipar estes pontos poupa tempo.
Erros comuns e como evitá-los
Olhar só para o preço
Uma casa com condomínio alto, fraca eficiência energética ou obras pendentes pode sair mais cara por mês do que outra ligeiramente mais cara na compra.
Ignorar a avaliação
Negociar muito acima do mercado pode não ser acompanhado pelo avaliador, obrigando a reforçar a entrada. Confirmamos comparáveis e mantemos racionalidade.
Assinar sem ler a FINE
Alterações pequenas em spread, comissões ou produtos associados mudam a TAEG e o custo total. Validamos sempre versões finais e pedimos esclarecimentos por escrito.
Esquecer o fundo de emergência
A primeira conta inesperada aparece sempre. Sem reserva, surge o stress e decisões piores.
Perguntas essenciais
Nas visitas
• Quando foi a última intervenção no edifício?
• Qual a classe energética?
• Valor de condomínio e obras aprovadas?
• O que fica com a venda?
• Há infiltrações ou vizinhança ruidosa?
• Há estacionamento fácil?
Ao banco ou intermediário
• Qual a TAEG com e sem produtos associados?
• Custo dos seguros dentro e fora do banco?
• Custo de amortizar parcialmente?
• Validade da proposta?
• O que acontece se a avaliação ficar abaixo do preço?
Checklist final
• Planeamento financeiro e taxa de esforço alvo definidos.
• Pré-aprovação obtida em dois ou três bancos.
• Matriz de critérios criada e usada nas visitas.
• Documentação legal do imóvel verificada por profissional.
• CPCV com condições suspensivas claras e sinal controlado.
• Avaliação bancária realizada e validada.
• FINE lida na íntegra e dúvidas esclarecidas.
• Impostos pagos antes da escritura.
• Seguros ativos à data da escritura.
• Registos feitos e documentos guardados com segurança.
• Contratos de água, luz e gás atualizados e morada fiscal alterada.
Glossário
• TAEG: custo total anual do crédito.
• Spread: margem do banco adicionada ao indexante.
• Indexante: referência como Euribor.
• LTV: percentagem financiada face ao menor entre preço e avaliação.
• FINE: documento com condições finais do empréstimo.
• CPCV: contrato de promessa de compra e venda.
• IMT: imposto municipal pago na compra.
• IMI: imposto municipal anual.



