O preço por metro quadrado nas cidades portuguesas. O que os números revelam sobre o mercado e as decisões de quem quer comprar casa

O preço por metro quadrado nas cidades portuguesas. O que os números revelam sobre o mercado e as decisões de quem quer comprar casa

Entre 2020 e 2024, o preço médio por metro quadrado nas principais cidades portuguesas cresceu de forma consistente, espelhando um fenómeno que há muito deixou de ser exclusivo de Lisboa e do Porto. Hoje, a valorização do imobiliário chega a quase todas as regiões, impulsionada por um conjunto de fatores económicos, sociais e culturais que vale a pena compreender com calma.
Este artigo explica a evolução dos valores, o que está por trás das diferenças regionais e como estes números influenciam as decisões de quem está a pensar comprar casa.

A fotografia dos preços o que mudou em cinco anos

De acordo com dados compilados do Idealista e da Confidencial Imobiliário, o preço médio por metro quadrado nas cidades portuguesas subiu em praticamente todas as regiões entre 2020 e 2024.

  • Lisboa: de 3 290 €/m² em 2020 para 4 279 €/m² em 2024 (+30%)
  • Porto: de 2 107 €/m² para 2 916 €/m² (+38%)
  • Faro: de 2 347 €/m² para 3 558 €/m² (+51%)
  • Braga: de 1 062 €/m² para 1 689 €/m² (+59%)
  • Coimbra: de 1 196 €/m² para 1 524 €/m² (+27%)
  • Funchal: de 1 683 €/m² para 3 251 €/m² (+93%)

O caso de Lisboa é o mais visível: apesar de já partir de valores muito elevados, a capital continua a ser a cidade mais cara do país. Mas o que mais chama a atenção é o ritmo de valorização fora do eixo Lisboa-Porto. Cidades médias e regiões turísticas registam crescimentos expressivos, em alguns casos, superiores a 50%.

O Funchal é um exemplo emblemático. Com o crescimento do turismo e o investimento estrangeiro, os preços duplicaram em apenas cinco anos. Já Braga e Faro destacam-se como polos de atração para jovens famílias e profissionais do setor tecnológico, beneficiando de boa infraestrutura e qualidade de vida a custos ainda inferiores aos da capital.

O que explica esta valorização?

Há três grandes motores por trás desta tendência:

a) O desequilíbrio entre oferta e procura

Portugal constrói muito menos do que a procura exige. Em 2023, foram licenciadas cerca de 23 mil novas habitações, um número insuficiente face à procura crescente, segundo o INE. Esta escassez pressiona os preços — sobretudo em zonas urbanas onde o solo é limitado e caro.

b) O aumento do investimento estrangeiro

Programas como o Golden Visa e o Non-Habitual Resident (NHR) trouxeram um novo perfil de comprador: investidores e reformados estrangeiros com maior poder de compra. Mesmo após o fim dos benefícios fiscais, o impacto mantém-se. Em 2024, mais de 11% das casas vendidas em Portugal foram compradas por não residentes, segundo o INE.

c) As baixas taxas de juro (até 2022)

Durante quase uma década, o crédito barato alimentou o apetite pela compra. Muitos compradores aproveitaram taxas historicamente baixas para investir, mesmo sem intenção imediata de habitar. A partir de 2022, a subida das taxas Euribor abrandou este ritmo, mas não reverteu os preços.

As diferenças regionais um mapa desigual

O preço por metro quadrado é, acima de tudo, um reflexo da economia local e da atratividade de cada cidade.

  • Lisboa e Porto concentram grande parte dos empregos qualificados, universidades e investimento estrangeiro.
  • Faro e o Funchal são destinos turísticos e de reforma, com forte procura internacional.
  • Braga, Aveiro e Leiria afirmam-se como polos emergentes, impulsionados por indústria tecnológica, universidades e qualidade de vida.
  • O interior do país continua a ter preços bastante inferiores em alguns distritos, menos de um terço dos valores da capital, mas começa a ganhar relevância no teletrabalho e na habitação de segunda residência.

Entre 2020 e 2024, o preço médio nacional cresceu cerca de 37%, mas o interior cresceu a um ritmo menor (entre 15% e 20%), o que aumenta o fosso entre regiões.

O impacto nas famílias e no crédito à habitação

A valorização dos preços tem consequências diretas nas decisões financeiras das famílias.
De acordo com o Banco de Portugal e estudos recentes:

  • A idade média de quem contrai crédito à habitação é 38 anos.
  • A taxa de esforço (percentagem do rendimento mensal destinada à prestação) situa-se em média nos 26–30%, dentro dos limites recomendados.
  • O montante médio dos novos empréstimos em 2023 foi de 171 435 €.
  • Cerca de 68% dos novos contratos têm um rácio loan-to-value (LTV) até 80%, ou seja, o comprador entra com pelo menos 20% de capitais próprios.

Estes dados mostram que, embora a valorização pese no bolso, as famílias continuam prudentes. A maioria cumpre as recomendações de endividamento e procura taxas mistas para mitigar o risco de variação dos juros.

Contudo, há uma consequência mais estrutural: o aumento da barreira de entrada. Com casas mais caras e maior exigência de capitais próprios, muitos jovens adiam a compra ou ficam presos à renda.

Comprar ou esperar? O dilema atual

Perante um mercado em alta há anos, a dúvida é inevitável: ainda compensa comprar agora?

A resposta depende de três fatores:

  1. Horizonte de tempo – Quem compra para viver e manter o imóvel por muitos anos tende a estar protegido das oscilações de curto prazo.
  2. Taxa de juro – Com a Euribor a estabilizar e ligeira tendência de descida em 2025, as condições poderão voltar a ser favoráveis, especialmente em crédito misto.
  3. Liquidez e segurança financeira – Ter poupança para a entrada (20%) e uma margem para imprevistos continua a ser essencial.

A valorização dos imóveis em Portugal não mostra sinais de inversão estrutural. Mesmo que haja ajustes temporários, o cenário de médio prazo aponta para estabilidade em níveis elevados, especialmente nas cidades com mais emprego, serviços e turismo.

Literacia financeira essencial: o que deve observar

Antes de decidir, é importante compreender alguns conceitos que influenciam o custo real da casa:

  • TAEG (Taxa Anual de Encargos Efetiva Global): mostra o custo total do crédito (juros, comissões e seguros).
  • Spread: margem de lucro do banco sobre a taxa de referência (Euribor).
  • LTV (Loan-to-Value): percentagem do valor do imóvel financiada pelo banco. Quanto menor, maior a segurança para o comprador.
  • Taxa de esforço (DSTI): percentagem do rendimento mensal que vai para pagar o crédito. Idealmente inferior a 35%.
  • Amortização antecipada: permite reduzir o capital em dívida e os juros futuros.

Compreender estes elementos ajuda a comparar propostas e evitar surpresas.

A visão prática de como usar esta informação

O preço por metro quadrado é um indicador útil, mas não deve ser o único.
Para uma decisão equilibrada, considere:

  • Preço absoluto vs. rendimento disponível: uma cidade com imóveis mais baratos pode ter salários mais baixos, anulando parte da vantagem.
  • Custos adicionais: IMT, imposto de selo, escritura, seguros e mobiliário podem representar até 10% do valor total.
  • Potencial de valorização: zonas com nova infraestrutura (metro, universidades, turismo) tendem a crescer mais.
  • Qualidade de vida: tempo de deslocação, serviços e tranquilidade são fatores que não aparecem nas tabelas, mas pesam no valor real do investimento.

Conclusão, ler o mercado com clareza

Entre 2020 e 2024, o mercado imobiliário português passou por uma transformação profunda.
Os preços subiram em todo o país, mas também amadureceu a forma como os compradores decidem. Hoje, o acesso à informação e ao aconselhamento financeiro permite decisões mais conscientes.

Comprar casa continua a ser uma das maiores decisões da vida financeira de uma família e talvez a mais emocional.
Com dados, comparação e acompanhamento, é possível fazê-lo com serenidade.

Glossário

  • Preço por metro quadrado: valor médio de venda de um imóvel dividido pela área total (m²).
  • TAEG: taxa que reflete o custo total de um crédito.
  • Spread: margem que o banco adiciona à taxa de referência.
  • Euribor: taxa de juro de referência usada nos empréstimos à habitação.
  • LTV: proporção entre o valor financiado e o valor do imóvel.
  • DSTI: rácio entre a prestação mensal e o rendimento líquido mensal.
  • Amortização antecipada: pagamento antecipado de parte do empréstimo.

Fontes consultadas

  • Idealista, Property Price Reports 2020–2024
  • Confidencial Imobiliário, Índice de Preços Residenciais
  • Banco de Portugal, Relatório sobre o Crédito à Habitação
  • INE – Instituto Nacional de Estatística, Estatísticas da Construção e Habitação 2023
  • Relatório sobre os Hábitos Financeiros e Uso de Crédito em Portugal (2024)
  • Perfil dos Consumidores por Tipo de Crédito em Portugal (2024)

Mais blogs

Explorar blog